Preconceituosos são os outros!

Por: Julio Marinho

A verdade é que ando de saco cheio de ver gente, que é vítima de preconceito, sendo tão ou mais preconceituosa que seus algozes.

Tá difícil entender o que está acontecendo no mundo, muito difícil. Enquanto países, como Inglaterra, França e, mais lentamente, os EUA, evoluem e reconhecem que cidadãos LGBT's devem ter os mesmos direitos que héteros, outros, como a Rússia, remam contra a maré e criam leis que punem as pessoas que não fazem parte da orientação sexual dominante, ou, como eles tanto gostam de dizer, "tradicional". Como se fugir a norma ou o que eles chamam de "tradicional", fosse um crime ou defeito. 

Aqui no Brasil, se por um lado o Judiciário tenta de todas as formas reparar as injustiças cometidas contras os cidadãos LGBT's, o Congresso nacional e a presidência da república fazem cara de paisagem, e ainda tem a pachorra de reclamar quando o judiciário faz o que eles deveriam já ter feito há muito tempo. Mas o que causa mais espanto e revolta é perceber que, apesar de tantos debates, tantas campanhas de conscientização, tanta abertura de informação, apesar disso tudo, a gente ainda vê pessoas que são vítimas de preconceito, divulgando e reproduzindo os mesmos estigmas e sendo tão ou mais preconceituosas e discriminatórias que seus algozes. 

A gente sabe que o coletivo que foge do padrão da heteronormatividade é plural e comporta várias tribos, mas, apesar de todas as diferenças - e que bom que elas existam - há em comum o estigma de não fazer parte do padrão imposto pela sociedade, entretanto, o que deveria ser um elo de coesão, acaba sendo um meio de desunião. E como se isso já não fosse bastante deprimente, ainda vemos uma repugnante disputa para saber quem sofre mais preconceito, quem é mais estigmatizado, discriminado e, por conta disso, merece mais atenção. Até parece que é possível se medir sofrimento, ou que seja possível se enquadrar e escolher em que nicho se colocar para fugir desse ou daquele estigma. É como se as pessoas estivessem competindo para saber quem tá mais fudido nessa merda toda, quem tá mais enterrado na bosta. E nessa luta para tirar a cabeça da lama, empurramos quem está ao lado pro fundo do poço. Cada pertencente a uma tribo usa seus parâmetros - baseados em preconceitos - para se julgar superior ao outro. Uma lógica perversa onde o diferente passa automaticamente a ser criticável e alvo das mais variadas injúrias e provocações. 

Será que somos todos preconceituosos, segregacionistas e estigmatizadores? Será que faz parte do nosso DNA, da nossa cultura, do nosso "modus operandi"? Será por isso que, mesmo no meio de grupos estigmatizados pelos mais variados preconceitos, vemos a reprodução do mesmos? Não é difícil, por exemplo, ver LGBT's reproduzindo a velha dinâmica de superioridade encontrada no restante da sociedade. Da mesma forma como não é nada difícil ver negros, feministas e outros tantos grupos que são alvos de preconceito, propagando o velho discurso homofóbico. É como se para acabar e anular uma ação discriminatória, fosse necessário fortalecer e validar outra. Cada um puxa a brasa para sua sardinha e, consequentemente, joga água na brasa do outro.

A meu ver, era de se esperar que, apesar das diferenças, grupos que sofrem mais com o preconceito tivessem uma maior compreensão das mazelas alheias, no entanto, não é isso o que vemos, em certos casos, muito que pelo contrário. Isso tudo vai acabar um dia? Acho pouco provável, para não dizer impossível, até por que, grupos são formados naturalmente. Pessoas se aproximam por semelhanças e identificações, e acabam, equivocadamente, segregando os "diferentes". Há talvez ai uma confusão entre diferença e antagonismo.

O importante não é anular as diferenças, já que estas são legítimas - e muito bem-vindas -, mas sim conhecê-las, aceitá-las e tentar conviver de maneira saudável e até divertidas (por que não?) com elas. Podemos estabelecer elos e transitar entre os grupos, sem que para isso, tenhamos que perder nossa própria identidade. Essas pessoas perdem tanto tempo tentando se distanciar, que não veem o quanto é maravilhoso a integração, o quanto é bom conhecer o outro e se fazer conhecer. Talvez com um olhar mais atento e menos egoísta, possamos entender e até aceitar as diferenças. É isso que, no futuro, vai fazer toda a diferença.

Comentários

  1. Então, se você for efebófilo, logo é excluído do meio lgbt, pois os próprios não querem manchar ainda mais a reputação do meio, sem contar que a esmagadora maioria te condena usando o mesmo discurso que os homofóbicos usam contra lgbt, dizem que sua preferência de relacionamento é doentia, é pervertida, é nociva, abominável, etc.

    Até a pouco tempo, a homossexualidade também era considerada parafilia e a maioria achava impensável essa situação mudar na nossa cultura, mas mudou. Hoje os próprios lgbts fazem coro com a maioria nos discursos de ódio contra aqueles que ainda são classificados como portadores de parafilias, de sentimentos e desejos "moralmente" reprováveis. Falta empatia, falta compreensão e principalmente boa vontade na esmagadora maioria das pessoas quando se trata dos sentimentos e felicidade alheios.

    Até quando?

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