O casamento e a liberdade de escolha

Por: Walter Silva

Se você não deseja casar-se, não se case. O casamento de uma pessoa é um evento que diz respeito unicamente àquela pessoa. O casamento de terceiros não me afeta, não me aumenta, não me diminui, não me exige nada. Não existe nenhuma lei no ocidente obrigando alguém a casar-se.

Eu nunca entendi essas pessoas pós modernas que insistem em fazer campanha contra o casamento gay, engrossando o coro dos contrários do lado dos homofóbicos. E o pior, o que me dá mais raiva, é que dentre tais pessoas, há LGBTs asquerosos como Camille Paglia, tão pós moderna que foi capaz de ver alguma virtude feminista até em Sara Palin, ou o fantoche dos reacionários, travestido de ''ativista LGBT'', o francês Bongibault, que se envolveu em luta encarniçada contra direitos civis da comunidade gay na Europa e é citado com admiração pelos nossos inimigos.

Porque essas pessoas não se calam? Melhor, porque a terra não é generosa e se abre para engolir todos eles?

O casamento do mesmo sexo não é imitação do casamento entre homem e mulher. Não surgiu devido à uma necessidade de assimilar valores heteronormativos.

Existe uma longa tradição comprovada em registros históricos, testemunhada por diversas pessoas, de casamentos do mesmo sexo ao longo dos séculos,nos quatro cantos da terra. Inúmeras fontes gregas garantem que em Tebas o estado permitiu o casamento (escrevo casamento onde as fontes se referiam a ''casamento'') de homens com rapazes; Xenofonte diz isso em ''Constituição de Esparta''. Plutarco dá detalhes dessas cerimônias, mencionando que ocorriam diante do santuário dedicado a Iolaus,amante de Héracles.

De modo semelhante, na colônia espartana da ilha grega de Thera, inscrições esculpidas na rocha do terraço do templo de Apolo Carneiro (visíveis ainda hoje), revelam que os efebos invocaram o nome do deus antes de consumar a relação sexual uns com os outros, numa inequívoca aspiração ao matrimônio.

Documentos onde se condenava o casamento do mesmo sexo também foram encontrados, evidenciando a existência do ritual no passado remoto; a exegese judaica do Levítico, a ''Sifra Acharei Mot'', do terceiro século da era comum, (Parasha 09:08) exorta: "Levando em conta as obras da terra do Egito (...) e as obras da terra de Cânaã (...) você não deve andar conforme suas leis. Isto você não deve fazer, pois. E o que eles fizeram (no Egito e Canaã)? Um homem se casou com outro homem, e uma mulher se casou com outra mulher (...).
É por isso que é dito que ’você não andará conforme suas leis’".

Em Roma, pessoas comuns e imperadores se casaram com o mesmo sexo; Nero foi esposo e marido de um homem por duas vezes. Heliogábalo casou-se com um atleta de Smirna. Sátiras de Juvenal e Marcial, expressando o opróbrio da sociedade machista e homofóbica dos seus dias, revelam que homens se casaram com homens naqueles dias, mesmo sem a validade jurídica necessária.

Petrônio escreveu uma novela (Satiricon) cujos personagens principais são um casal de amantes homossexuais, em uma relação formal chamada contubernium, o casamento entre senhor e escrava. Em Roma se observa ainda o caráter distintivo entre o casamento do mesmo sexo e o casamento do sexo oposto; o casamento dos heterossexuais em toda parte parece corresponder a um negócio como a pecuária, cujo propósito é a concentração de renda e reprodução da espécie. A mulher e os filhos são propriedade do marido; não se trata de um arranjo por amor. Os noivos frequentemente se casam à revelia da própria vontade. Em contraste, casais do mesmo sexo se casam em toda parte por amizade e amor. É a única razão pela qual eles se unem. Tanto é assim que Juvenal fica escandalizado com o casamento do aristocrata Graco com um humilde tocador de corneta,escarnecendo da baixa posição social do marido de Graco.

Não são os gays que estão imitando os heterossexuais, ao contrário da afirmação jocosa dos pós modernos, ignorantes do passado; o atual modelo de casamento entre homem e mulher, o casamento por amor, onde os parceiros são considerados iguais, e os noivos se escolhem livremente de acordo com laços de afeto é que é claramente um padrão encontrado nas antigas uniões do mesmo sexo.

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