Os apóstolos do ódio e as minorias marginalizadas no Brasil


Por: Marcelo Ribeiro da Silveira*

A cada dia brasileiros de bem assistem passivamente a milhares de concidadãos serem perseguidos, humilhados, violentados e até assassinados nas ruas pelo simples fato de serem "diferentes", ou por possuírem uma orientação sexual não dominante na sociedade. O "estranho" ou o "diferente" nos incomoda tanto, nos apavora e em alguns casos enoja e por quê? Porque tanto incômodo com o casamento gay? Qual o motivo de tanta aversão e histeria generalizada para com os direitos dos LGBTs (lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros)? Qual a razão de tanto ódio e atos de barbárie direcionados a uma minoria tão marginalizada e silenciosa? Quando digo minoria silenciosa, refiro-me aos milhares de jovens que, invisíveis, não estão na mídia, na política ou até mesmo nas ditas paradas gays. São eles as maiores vítimas de preconceito e violência gratuita, a começar dentro de casa, quando expulsos e atacados na sua alma e dignidade adolescente.  A eles dedico estas singelas linhas.

Temos que observar a realidade da qual não participamos, e ela existe para – talvez – fazer com que cada um de nós reveja seus conceitos e respeite as diferenças ao nosso redor. Tentar ser "mais humano" e menos cruel. Tanto que a própria Justiça não inovou, ao reconhecer e estender os direitos da união estável aos homoafetivos, mas apenas reconheceu uma realidade social muito antes construída. O Judiciário agiu salutarmente, tirando da escuridão uma situação que há milênios a sociedade já experimentava e assistia, mas que muito ainda tem que avançar na seara dos direitos humanos individuais.

Toda essa situação conturbada conta ainda com um complicador perverso: o ingrediente ultraconservador religioso-fundamentalista, que só endurece os corações e cega o olhar da justiça, para confundir e "converter" a plateia desinformada e leniente com a barbárie. Impondo a sua vontade por um estado teocrático, os fanáticos religiosos acusam-nos cinicamente de querermos implantar uma ditadura gay no país, o que é uma farsa. Se vivemos sob alguma ditadura, a vigente é a da intolerância e do conservadorismo religioso-fundamentalista.

O Brasil, no quesito direitos humanos dos LGBTs, anda ainda na contramão do mundo, quando comparado com vários países do planeta, incluindo nossa vizinha Argentina, que já garante a legalidade do casamento gay e de outros direitos fundamentais, mais que a simples união estável. Vale observar: alguns destes são países de matriz católica, muito mais conservadores que o nosso Brasil. 

Os gays não são donos de rádios, jornais e canais de televisão aberta, meios de comunicação oferecidos por concessão do Estado. Também eles não são nomeados Ministros de Estado, para que sejam mantenedores da união e obediência à base religiosa do governo no Congresso. E muito menos, não são donos de mentes e corações, para obter lucros financeiros extraordinários, usando e abusando do nome de Deus. O fato de poder executivo central alimentar os fundamentalistas com privilégios e instrumentos de poder político ou de concessões de rádios e TVs, abre brecha a um "Estado" paralelo perigoso. 

A orientação sexual merece tutela jurídica sim, porque é inerente à condição de ser pessoa. Expressá-la é mais que um direito à dignidade da pessoa humana, é a certeza de vivenciar uma sociedade livre e justa. Se por ora não podemos experimentar uma sociedade igualitária, que ela seja, ao menos, equitativa e respeitosa. A dignidade de cada indivíduo é a garantia de sua igualdade de tratamento perante a lei, independentemente de sua orientação sexual, ideologia, classe social e econômica ou de sua religião. Como todas as pessoas, também os gays querem desfrutar das garantias do direito à vida, à liberdade, o direito sagrado de ir e vir e ao direito de ter direitos. Só querem ser felizes e respeitados na sua dignidade, sem privilégios e com igualdade de tratamento. 

O Estado é laico e, portanto, deve assegurar a todos o direito de crença. Deve ainda não ter paixões religiosas, sendo que nenhuma religião deve pautar sua ação em detrimento das demais. Porém, esse laicismo vem sendo sistematicamente desconfigurado e confundido. Por isso um apelo: "ACORDE CONGRESSO NACIONAL, MANIFESTE-SE PRESIDENTE DILMA"!

Uma democracia de fato não dá carta branca ao opressor para, por meio do discurso religioso, segregar ou violentar qualquer pessoa. A liberdade sem responsabilidade e humanismo é anomia e não mais liberdade. É preciso, portanto, que se criem mecanismos, com a iniciativa e incentivo do Estado, que coíbam o discurso violento e excludente, seja ele laico ou religioso.

Admirável e exemplar o posicionamento do grande mestre professor drº Luís Roberto Barroso, no memorável dia da aprovação no STF da união estável homo afetiva, para refletir: "Não tenho aqui a pretensão de mudar a convicção nem a fé de qualquer pessoa, o que faz a beleza de uma democracia, de uma sociedade plural e aberta é a possibilidade de convivência harmoniosa de pessoas que pensam de maneira diferente...". "Ninguém deve ser diminuído nessa vida pelos afetos que possuem".

Dentre as religiões que existem, não deve haver alguma que não pregue o amor ao próximo, pelo menos na teoria. A maioria delas acredita em um Deus bom, Pai e salvador, que veio a Terra encarnado na pessoa do próprio filho. Jesus Cristo, desde menino, exercitou a tolerância e o mais puro amor ao próximo e em nenhuma de suas pregações incitou o ódio ao semelhante ou negou a alguém o direito de subir ao Reino do Céu. Nunca pregou o separatismo fundamentalista, pois Ele amava a todos indistintamente. Basta lembrar que impediu que Maria Madalena fosse apedrejada, multiplicou pães para dar de comer a quem tinha fome e morreu na cruz para salvar toda a humanidade, sem exceção. 

Ou amemos o nosso semelhante na sua integralidade, incluindo seus defeitos e pecados ou não amamos ninguém e nos odiemos a todos indistintamente, declarando guerra (santa?) uns aos outros e aos "diferentes". E por assim agir, não poderemos jamais encher a boca e bater no peito, nos intitulando cristãos ou crentes filhos de Deus. Menos intolerância e ódio, mais amor e respeito, por favor! A fé que professo me faz dizer: "SEI QUE EU NÃO SOU LIVRE, ENQUANTO UMA PESSOA PERMANECER ESCRAVA...", como é caso desses opressores, que são os mentalmente escravos, atados às pesadas correntes da ignorância e da bestialidade humana de uma época medieval. Por tudo isso, cabe questionar: qual é a justificativa de alguns poucos e barulhentos evangélicos e católicos se posicionarem de modo tão assustadoramente preconceituoso, sexista e violentamente insano contra uma minoria de simples cidadãos brasileiros, pagadores de impostos, eleitores e de fato partícipes da vida social? Agem cegamente como verdadeiros cães de guarda de Deus. Quem disse a essa meia dúzia de pregadores, pastores ou padres que é pecado amar o seu igual? Quem lhes outorgou a missão de banir o diferente e a diversidade sexual da face da terra? Por que se arvoram no direito inquisitório e medieval de ser a mão de Deus na terra a separar os "bons" dos "maus"? Os "pecadores" dos "santos"? O que pensaria Jesus hoje? E, por último: será que Deus é sexista e homofóbico?

Conclamo a todos eles, os apóstolos e pregadores das diversas vertentes religiosas homo fóbicas, a somarem com o resto da boa e esperançosa humanidade, sim ela existe e é gigantesca. Que eles possam canalizar e focar toda essa energia e poder da palavra que possuem para banir da face da terra a fome, a miséria, as guerras insanas e covardes. Que deixem de lado, ou até mesmo esqueçam, a sexualidade e a genitália individual alheia e se dediquem mais tempo e ação ao que interessa de fato: os problemas urgentes da humanidade e do planeta terra. Sem ódios, machismos ou revanchismos. Que se empenhem pelo aniquilamento da corrupção, da mentira, da ignorância e das doenças nos países pobres. 

Que eles colaborem para frear o avanço do aquecimento global, a disseminação das armas nucleares e das drogas que destroem famílias inteiras. E, principalmente, que possam dar um basta ao preconceito, à discriminação, ao racismo e a violência gratuita. Seria bem mais produtivo e positivo para a humanidade, se seus líderes, políticos e religiosos, se esforçassem com mais sinceridade e afinco, nessa luta em benefício de todos. Respeitando as Leis do País e a dignidade da pessoa humana em primeiro lugar. 

Resta a nós humildemente, cristãos de verdade e cidadãos conscientes, refletir e seguir os passos do Pai, no seu mandamento máximo: "AME A DEUS SOBRE TODAS AS COISAS E AO PRÔXIMO COMO A TI MESMO".  E em paralelo com o artigo 5º da constituição federal: "TODOS SÃO IGUAIS PERANTE A LEI, SEM DISTINÇÃO DE QUALQUER NATUREZA, GARANTINDO-SE AOS BRASILEIROS E AOS ESTRANGEIROS RESIDENTES NO PAÍS A INVIOLABILIDADE DO DIREITO À VIDA, À LIBERDADE, À IGUALDADE, À SEGURANÇA E A PROPRIEDADE...". sem fanatismos, ignorâncias e separatismos obscurantistas. Basta de guerras injustificáveis no mundo de hoje. Somos todos irmãos.

Ergamos a bandeira da paz. Não só pelo fim da homofobia que mata, mas por toda e qualquer forma de discriminação e preconceito que gere violência, ceifando a vida de inocentes. Ser verdadeiramente humano e cristão é ser de Deus e Ele é amor em estado puro. Tentemos olhar o próximo, através dos olhos de Deus. É chegada à hora de assegurar a todos o direito inalienável e fundamental ao afeto e à felicidade. Salve a sociedade livre! Parabéns ao corajoso STF! Viva o Estado Laico e a Democracia!

*Marcelo Ribeiro da Silveira. Acadêmico de Direito (5º sem./UCDB 2015). Func. Público. Espírita de coração, católico de batismo ou simplesmente um cristão tolerante em formação.


Comentários