Pois que estimados leitores, Barack Obama, o presidente certo no
time errado, mais ou menos ao contrário do caso de todos os presidentes
de clube no Brasil, vivia um momento difícil. Presidentes americanos
que não se elegem para um segundo turno são raros, o último, Jimmy
Carter, até hoje chora as mágoas do atropelamento que sofreu pela
direita que veio com Reagan e está lá até hoje, tornando a vida
americana mais difícil e o governar impossível.
Obama enfrentou a maior crise econômica desde a Depressão, herdou
um país complicado por duas guerras externas e uma guerra cultural
interna, tudo isso promovido pelos republicamos, que deveriam, fosse
esse mundo um lugar normal, ter a interdição decretada por insanidade
coletiva. Além de entregar ao primeiro presidente negro essa missão
enorme, os eleitores americanos tornaram o governo dele inviável, ao
elegerem uma maioria republicana no Congresso, dois anos após ele chegar
ao poder. E lá estava Obama, vendo 2012 avançar e o posto dele a
perigo, com o outro lado escolhendo um esquisitíssimo Mitt Romney, que
jamais deveria ser levado a sério e ainda asim vai ter mais ou menos 50%
dos votos, porque as eleições lá são jogos de basquete e decididas no
detalhe ou na possível fraude, como no ano 2000 e do George Bush Jr.
Pois nesse momento difícil, jogo num momento crítico e até a mãe do juiz ajudando o time adversário, Obama fez o que qualquer zagueiro aplaudiria: deu um passinho à frente e deixou toda a direita impedida. Placa!
Tudo que o nosso craque da bola com efeito fez foi dar uma chamada
finta, em zagueirospeak clássico. Obama chamou uma entrevista assim
como quem não quer nada, para comentar sei lá, o material mais provável
para o revestimento do Itaqueirão e ali, no meio da calmaria disse em
alto e bom tom que ele, Obama, é a favor da legalização do casamento
gay.
Fontes seguríssimas me garantem que o Silas Malafaia quase teve um
derrame, e apenas por sorte alguém lembrou que isso somente acontece com
quem tem um cérebro, e ele precisa ter sido usado ao menos uma vez nos
últimos doze anos. Emparedado pelo Obama, Mitt Romney, que para maior esquisitice é
mórmon, deu a entender que ele, no poder, revogaria a união estável para
gays. Não falou que tornaria a escravidão legal de novo e um must nas
rodas chiques, mas foi por pouco.
Pois Obama foi lá e deu de três dedos, com malemolência e estilo.
Disse que as filhas dele, meninas ainda, convivem com filhos de casais
gays e não entendem porque eles deveriam ser discriminados. Não entendem
porque não vêem nada errado ou diferente acontecendo. Vêem apenas o que
há para ver, casais, hetero ou não, vivendo juntos para o que der e
vier, tendo filhos de um jeito ou de outro, e se esforçando para serem
pais desses filhos nesse nosso mundo desengonçado.
O casamento gay é um passo fundamental na construção de sociedades
mais saudáveis e menos malucas. Se os religiosos não podem compreender
isso, se a desprezível homofobia – tão desprezível quanto o racismo -,
os impede de compreender e de serem bons seres humanos, então saiam do
caminho. Ninguém está dizendo a eles para casarem com gays. Da mesma
maneira que eles não podem impor seu cristianismo a um muçulmano, ou
vice-versa, eles não podem impor as suas crenças a quem não compartilhe
delas. Simples. Saiam do caminho, porque a vida saudável vai em frente.
A tradição americana mostra que quando um presidente realmente
resolve, o que ele resolve se torna a lei do país. Se isso é real, Obama
vai partir para a batalha, e, dependendo do resultado da eleição, mais
ou menos folgada, ele vai ter o mandato para realizar o que a maioria já
quer, mesmo que não tenha decidido se incomodar para valer com o
assunto.
Zagueiros possuem uma teologia um tanto escassa. Compreendem que
algo místico acontece quando conseguem desviar a bola usando apenas a
força do olhar. Zagueiros não perdem tempo com elaborações esotéricas, e
não compreendem porque alguém vai deixar que a vida seja guiada por um
livro escrito em aramaico intraduzível, quando o mundo oferece um apito
como alternativa.
Fonte: Terra
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