Por: Julio Marinho
"Dunno Y Na Jaane Kyon"
"Dunno Y Na Jaane Kyon"
O último tabu de Bollywood!
Pela primeira vez, um filme indiano de grande apelo comercial, retrata uma relação homossexual de forma séria. O cineasta indiano Sanjay Sharma é um homem religioso. Isto se torna óbvio quando se ouve o ringtone do seu celular, ao invés de um toque convencional, se ouve "Om Bhur Bhuva Swaha", uma canção de devoção que se ouve em templos hindus.
O fato de Sanjay ser tão religioso ao ponto de ter esse tipo de ringtone, é no mínimo curioso, isso graças ao tema trado em seu filme: a homossexualidade na sociedade indiana. "Era um assunto difícil, eu sabia desde o início, mas eu não tinha idéia de quão desafiador seria realmente executá-lo.", diz Sanjay.
A indústria cinematográfica da Índia, Bollywood produz cerca de 1.000 filmes por ano, mas as relações entre pessoas do mesmo sexo ainda são um tabu. Foram feitas tentativas para abordar a homossexualidade, mas elas sempre foram caricaturais, como por exemplo em "Dostana" de 2008, em que os dois protagonistas masculinos fingem ser gays, para conquistar o afeto da protagonista.
"Dunno Y Na Jaane Kyon", entretanto, é diferente. A história de um casamento, entre um homossexual enrustido, Ashley, e um esforçado ator que se arrisca pela indústria do cinema, é o primeiro retrato sério de um relacionamento gay em Bollywood. O filme conta inclusive, com uma cena de um baijo gay de 90 segundos. Isso em se tratando de Índia, é um marco histórico.
"É um retrato sensível e íntimo do que é ser gay na Índia", diz o irmão de Sanjay, Kapil Sharma, que escreveu o roteiro e interpreta Ashley. "A cena do beijo não está lá para chocar. O script realmente necessitava de alguma intimidade entre os protagonistas."
"Parece bom", disse Ashok Row Kavi, editor da "Bombay Dost", primeira revista gay da Índia. Os tabus ainda são muito fortes, mas espero que as coisas mudem ".
O filme vem em um momento delicado na Índia. Pouco mais de um ano atrás, o Supremo Tribunal anulou uma lei de 150 anos, onde a homossexualidade era considerada crime. A Índia, que tem mais de 500 milhões de pessoas com idade inferior a 25 anos, esta em fase de derrubar tabus sociais e com um ritmo furioso, o que é bastante animador.
As mudanças na sociedade indiana ficaram evidentes, na estréia mundial do filme no festival internacional de cinema "queer" de Mumbai. "A resposta foi incrível", diz Kapil. "O auditório estava lotado e havia cerca de 500 pessoas esperando para entrar. Outro motivo de comemoração, é que não houve nenhum tipo de protesto religioso."
Kapil tinha motivos para se preocupar. A apresentação de filmes tratando de assuntos polêmicos, tem sido visto como flagrante desrespeito a cultura indiana por ativistas hindus. Em 2004 inclusive, houveram protestos violentos por parte do partido de direita nacionalista de Mumbai.
"Felizmente, os tempos mudaram e "Dunno Y..." tem um tom pacífica", diz Kapil. "O público indiano está cada vez mais tolerante a estas questões, ou seja, aceitando cada vez mais, e os partidos políticos estão percebendo que não podem ir de encontro as mudanças sociais."
Kapil, que não é gay, se preparou para o papel assistindo DVDs da série "Queer as Folk ", e diz que foi inspirado por Brian Kinney Gale Harold. Ele também pesquisou o papel, visitando salas de chat gay on-line, além de visitas a clubes gays clandestinos de Mumbai. "A primeira vez que fui a um desses locais, foi muito chocante para mim, ver que essa subcultura existe, um lugar onde os homens dançam com outros homens." Kapil diz que está desapontado, com a forma como Bollywood encara os estereótipos da comunidade gay, personagens afeminados, sempre com voz alta e scripts desviando para lado cômico. "Com a minha história, eu queria apresentar uma imagem verdadeira".
Kapil diz que o apoio para o filme vieram de fontes inesperadas. Duas heroínas lendárias de Bollywood dos anos 70, Zeenat Aman e Helen, concordaram em desempenhar um papel pequeno no filme, enquanto que Lata Mangeshkar, a cantora indiana mais talentosa e um repositório de valores morais de Bollywood, quebrou três anos hiato e cantou para o filme. Kapil, porém, lamenta que a indústria cinematográfica indiana não tenha um ator do calibre de um Sean Penn ou de Heath Ledger, que estariam dispostos a aceitar o papel de um homossexual.
"Quando eu estava escrevendo o roteiro, eu não tinha em mente nenhuma ator para o papel de Ashley," diz ele. "Eu queria um ator mais estabelecido e maduro. Mas quando me aproximei de alguns deles, eles rejeitaram de imediato, o que é bastante triste, porque se você oferecer a um desses atores o papel de um traficante ou um terrorista, eles irão fazê-lo. Alguns sugeriram que a trama gay não deveria ser a trama principal, talvez uma subtrama, enquanto outros me perguntaram se eu poderia abandonar a cena do beijo".
O filme foi exibido recentemente na primeira "Indian Film Festival" de Londres, onde recebeu críticas mistas.
Enfim, mesmo a Índia, um país tão arraigado em valores ultrapassados e intolerantes, vem aos poucos, mostrando que é possível mudar. Basta que para isso, se tenha um pouco de boa vontade e bom senso.
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