Fidel assume culpa pela perseguição aos gays em Cuba

Por: Julio Marinho


Fidel Castro disse que ele é o responsável pela perseguição sofrida pelos homossexuais em Cuba, depois da revolução de 1959. O ex-presidente disse ao jornal mexicano La Jornada, que houveram momentos de grande injustiça contra a comunidade gay. "Se alguém é responsável, sou eu", disse ele.

Na década de 1960 e 70, muitos homossexuais em Cuba, foram demitidos, presos ou enviados para campos de "reeducação". Castro disse que os homossexuais eram tradicionalmente discriminados em Cuba, assim como os negros e as mulheres. Mas, no entanto, ele admite que não prestou atenção suficiente ao que estava acontecendo contra a comunidade gay. "Na época estávamos sendo sistematicamente sabotados, houveram ataques armados contra nós, tivemos muitos problemas", disse o líder comunista de 84 anos. "Manter sempre um passo a frente da CIA, que estava pagando a tantos traidores, não foi fácil."
 
Em 1979, a homossexualidade foi descriminalizada e, mais recentemente, tem havido esforços no sentido de legalizar as uniões entre pessoas do mesmo sexo.
 
Na entrevista ao La Jornada, Fidel Castro também falou sobre o embargo econômico contra a ilha, que foi imposto pelos Estados Unidos em 1961. Ele disse que naquela época, já era tão prejudicial como hoje.

"O maior problema sempre foram os medicamentos e os alimentos, o que persiste até hoje", disse ele.
 
Os comentários do Sr. Castro foram, feitos na segunda parte de uma longa entrevista com a jornalista Carmen Lira. Na edição de segunda-feira, ele disse que tinha "batido as portas da morte" durante a longa doença que o obrigou a demitir-se como líder de Cuba.
 
Fidel adoeceu em 2006 e passou o poder a seu irmão Raúl, em 2008. Ele sofreu várias intervenções cirúrgicas, por causa de uma doença intestinal. "Eu me questionei várias vezes se (os médicos) realmente deveriam me deixar viver sob estas condições, ou se eles deveriam permitir que eu morresse", disse ao La Jornada.
 
Fidel Castro governou Cuba por quase 50 anos após a derrubada do governo de Fulgencio Batista, graças a revolução, liderada por ele e Che Guevara. Os comunistas continuam no poder e Fidel Castro continua a ser o líder do Partido Comunista, embora atualmente seu irmão Raúl seja o presidente do país.


Segue abaixo alguns trechos da entrevista:

"Mesmo que não haja nenhum indicio de que  ele se sinta desconfortável, eu não acho que Fidel vai gostar do que estou prestes a dizer."

Comandante, apesar dos encantos da Revolução Cubana, o reconhecimento e a solidariedade de grande parte do universo intelectual, as grandes conquistas do povo contra o bloqueio, em suma, tudo - tudo - foi por áqua abaixo, como resultado da perseguição contra os homossexuais em Cuba.

Fidel não foge ao tema.  Ele não nega nem rejeita o pedido.  Ele só pede tempo para se lembrar - diz ele - como e quando assumiu o prejuízo nas fileiras revolucionárias.

Cinco décadas atrás, com base na homofobia, os homossexuais eram marginalizados em Cuba e muitos foram mandados para campos de trabalho agrícola e os militares os acusavam de serem "contra-revolucionários".

Sim, ele lembra, foi um momento de grande injustiça - Uma grande injustiça! Ele repete enfaticamente - não importa quem fez isso. Se foi quem fez isso, fomos nós ...  Estou tentando definir a minha responsabilidade em tudo isso porque, obviamente, eu não defendo esse tipo de preconceito.

Sabe-se que entre os mais antigos de seus amigos, há homossexuais.

Mas então, como foi que o ódio contra o "diferente", foi estabelecido?

Ele acredita que tudo foi o resultado de uma reação espontânea nas fileiras revolucionárias, que veio da tradição.  Anteriormente em Cuba, os negros não eram os únicos discriminados, as mulheres também foram discriminadas e, claro, os homossexuais ...

Quem foi, então, direta ou indiretamente responsável por não por um fim, ao que estava acontecendo na sociedade cubana?  O Partido?  Porque o Partido Comunista de Cuba não "proibe explicitamente a discriminação" com base na orientação sexual.

- Não - diz Fidel - Se alguém é responsável, sou eu ...

"É verdade que, naquele momento, eu não poderia cuidar dessa questão ... eu me encontrava totalmente imerso, principalmente, na Crise de Outubro [como a crise dos mísseis cubanos de 1962, é conhecida na ilha], na guerra, na questões políticas... "

- Mas isso se tornou um problema político grave e sério, Comandante.

- Entendido, entendido ...  Nós não soubemos na época dar o devido valor ...  sabotagens sistemáticas, ataques armados foram acontecendo o tempo todo, tivemos tantos problemas, alguns terríveis, problemas de vida ou morte - você sabe?  - Não havia como dar atenção suficiente.

- Depois de tudo isso, tornou-se muito difícil defender a Revolução no estrangeiro ... A imagem tinha sido danificada para sempre em alguns lugares, especialmente na Europa.

- Entendido, entendido - repete -, era apenas ...

- A perseguição aos homossexuais poderia acontecer, com ou sem protesto, em qualquer lugar.  Não na Cuba revolucionária - digo a ele.

- Entendido, é como um pecado santo, né?  Não é a mesma coisa que quando um mero pecador comete um pecado, não é?

Fidel dá um leve sorriso, para em seguida, levar a sério novamente:

- Olha: Imagine como foram nossos dias, nesses primeiros meses da revolução, a guerra com os ianques, a questão do armamento e, quase simultaneamente, as tentativas de acabar com minha própria vida ...

Fidel revela como tudo isso teve uma "influência" enorme em cima dele, e como sua vida mudou diante disso tudo, as ameaças e os ataques reais que ele sofreu:

"Eu não podia ir a qualquer lugar, eu não tinha sequer que estar vivo ...Traições estavam na ordem do dia e eu tinha que "viver o dia-a-dia"...

"Para escapar da CIA, que comprava tantos traidores, as vezes no meio do meu povo, não era uma coisa fácil, mas o que fazer, afinal, se a responsabilidade tem de ser tomada, levo o meu próprio fardo. Eu não vou culpar os outros .. . ", diz o líder revolucionário.

Ele só lamenta não ter corrigido isso na época ... . O artigo prossegue, sem mencionar o trabalho de Mariela Castro.  A sobrinha de Fidel, na promoção dos direitos LGBT na ilha e os recentes avanços que incluem políticas públicas de saúde que permitem as pessoas transexuais de se submeter a cirurgia de mudança de sexo gratuitamente.


A perseguição terrível e bem documentada de lésbicas, gays e transgéneros em Cuba depois de 1959, é um episódio vergonhoso, lamentável e inaceitável da Revolução Cubana de Fidel Castro. Sua desculpa é significativa e salutar, mas não é suficiente para compensar o legado das próprias ações de seu governo. Muito mais seria necessário, incluindo ai uma severa punição. São no mínimo contraditórias, as ações dessas revoluções que pregam a liberdade de um povo. Quase sempre acabam por seguir caminhos diferentes aos regimes que combatem, mas esbarrando nos mesmos ou, em alguns casos, ainda em piores conceitos repressivos.

Comentários

  1. RICARDO AGUIEIRAS29/03/2012, 09:01

    Todavia, no lo creo.... Agora, prestes a morrer, cai bem esse tipo de comentário do Fidel... tem que posar de moderno, depois que as revoluções comunistas e os países comunistas fracassaram no mundo todo e Cuba continua a merda que sempre foi, infelizmente, por que é um povo de valor, com riquíssima cultura e arte. Basta ler o romance premiadíssimo, que depois virou um belo filme com o Javier Barden, "Antes do Anoitecer", do escritor cubano gay Reinaldo Arenas, para ver o horror que foi Cuba com relação aos gays. Falar, "fui eu" é fácil, mas está longe de ser desculpas públicas e longe de EXIGIR Direitos Humanos e LGBT's na ilha. Agora falta toda a desconstrução do hediondo machismo que Castro ajudou a erguer, levará décadas! Em tempo: há inúmeros presos políticos ainda, lá, mofando em condições desumanas nas prisões cubanas e morrendo em greves de fome, ele não está nem aí...
    Ricardo Aguieiras
    aguieiras2002@yahoo.com.br

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